domingo, 9 de agosto de 2009

GENTE, SOU FRANCESA!!!

Pois é, demorei, mas agora, eu já sei, sou francesa, e vou contar como descobri...


Deixei Paris há mais de 23 anos, achando tudo um saco, mesmo achando a cidade linda, maravilhosa, deslumbrante, mas não conseguia achar meu lugar alí, ou fazer meu lugar, enfim, dá no mesmo, sentia-me uma estranha no ninho...



Passo os detalhes, que sempre são muitos, e alguns muito interessantes, o mais interessante das histórias talvez, mas enfim, passo, deixei Paris para o Brasil, e as circunstâncias fizeram que Salvador fosse a cidade.

Na época, deslumbrei-me , não tanto com a cidade, que também é linda - podia ser muito mais linda, mas muito mais mesmo!- mas com o jeito de suas pessoas: pela primeira vez na vida - e eu já estava na casa dos 20, encaminhando-me para a próxima casa-, pela primeira vez, me senti fazer parte de qualquer coisa comum aos humanos!
Foi uma revelação, lembro-me de ter escrito isso em todas as longas cartas para os amigos, e era assim: pela primeira vez, senti que todos os humanos, mesmo com todas as suas diferenças ou peculiaridades pessoais, estavam todos em um mesmo barco, e eu também estava no barco, e foram os brasileiros, os baianos, que me fizeram sentir isso!
Na prática, como era isso? Muito simples, como é até hoje: aqui, aqui no Brasil, pois experimentei outras cidades de Norte a Sul, você pode falar com qualquer um, na rua, no ponto de ônibus, no elevador - salvo o elevador do prédio onde moro, pois lá moram pessoas que pensam que o barco delas é outro, certamente mais rico, vai ver algum cruzeiro transatlântico!!!-, na sala de espera, na fila do banco ou do mercado, enfim, parece que não é nada, mas para mim, foi tudo! E até hoje é, apesar da violência que tem assolado Salvador de uns 3 ou 4 anos para cá, e que tem entristecido muito a vida por aqui...
Bem, isto é ponto pacífico, o Brasil ensinou-me que eu era gente, que eu pertencia, ou, ao menos, me confirmou isso, pois era algo que eu sentia profundamente quando morava em Paris, mas tão poucos parisienses confirmaram que não foi suficiente...
Passaram-se os anos, os amores, os trabalhos, e aconteceu que uns dois anos atrás, viajei à França com meus filhotes, "para ver minha mãe no interior", como gosto de brincar para tentar comunicar que a viagem à França para mim está longe de ser tão exótica como o seria para um brasileiro da gema! E aconteceu que o tempo de estada em Paris me pareceu curto, curto demais, tantas coisas eu queria ver, tantos passeios, queria ficar mais, e, na hora de sair de Paris para voltar ao Brasil, chorei, chorei mesmo, com a bola na garganta que todo mundo conhece... Que novidade era essa?!?!?! Em todos esses anos, não tinha sentido saudade da França, o pão não me fazia falta nem os queijos nem os vinhos... Na Âmbar, eu gostava de brincar com os turistas quando me perguntavam por que eu tinha deixado a França "Paris me desanimou da França!..."
Tem uma cena do filme "O Piano" da Jane Campion, uma diretora neozelandesa, que eu gosto muito: é uma cena, lá quase no final do filme, em que a moça que é a personagem principal do filme coloca seu pé dentro das cordas de seu piano que vai ser jogado em alto mar, mas acontece que, quando ela já está sendo arrastada irremediavelmente pela corda para morrer afogada no fundo do mar, um ímpeto de vida, que ela não suspeitava mesmo, a faz livrar-se de sua botina para livrar-se da corda! Ela então soube novamente para a superfície da água e podemos ouvir sua voz gritando de espanto "What a death!... What a chance!... What a surprise!... My will chose life!...", em português "Que morte!... Que destino!... Que supresa!... Minha vontade escolheu a vida!..."
Por que contei isso? Porque foi uma supresa tão profunda assim que eu senti quando me apareceu esta dor de deixar Paris, de ficar longe de Paris e da França, não esperava... Esta dor confirmou-se desde então: saudades das estações, dos lugares, das regiões pelas quais já andei, e muita saudade mesmo dos lugares de Paris... Os parques, as ruas, os edifícios antigos, o Sena, as pontes, os monumentos às suas margens, e também, poder ir e vir mais em paz do que por aqui, poder fazer um pique-nique no gramado de um jardim...


Sim, poder fazer pique-nique é essencial pois os franceses são uma grande dinastia de farofeiros, é farofa de pai para filho, a Disney de Paris quase foi à falência por causa disso, os restaurantes não andavam, todos os visitantes franceses levavam seus sanduíches, e ainda devem levar, eu mesma levo!
E fazer pique-nique no Parc Monceau, este da foto, é puro prazer!!!
Enfim, descobri que eu sou francesa, mesmo!
Recapitulando: o Brasil me ensinou, ou me confirmou, que eu era humana, passageira da barca dos homens, coisa que a França não tinha conseguido confirmar, ou tinha até recusado, e agora, recentemente, a França me lembrou que eu era francesa, como que cobrando o que era dela afinal...
E agora, José? O que fazer com isso?
Quem souber morre", como fala um cara que eu conheço, e confesso que sempre morro de rir, idiotamente, também reconheço minha idiotice...
Mas enfim, voltando à vaca fria, não louca, nem inglesa, mas sim bem francesa, e sensata, vou ter que cuidar disso...

"CORALINE E O MUNDO SECRETO"

Hoje, vou fazer propaganda para um filme infantil que amei!
Chama "Coraline e o Mundo Secreto", e achei realmente encantador.


A história é envolvente - é uma adaptação de um livro de um famoso chamado Neil Gaiman-, lembra as histórias dos filmes japoneses da "Viagem de Shihiro" e do "Castelo Animado", ou seja, nada de água com açúcar da Disney e outras grandes casas de filmes infantis de animação. Tem momentos assustadores, mesmo, mas - psicólogos e outros psicanalistas concordam nisto-, como no final tudo se resolve, podem ficar tranquilos, seus pirralhos não vão ficar traumatizados com o filme, os meus adoraram, como adoraram "a Viagem de Shihiro", quando viram, e eram bem menores do que são hoje!
Os personagens são bem "plantados", bem colocados, convencem mesmo, todos eles.
A música é melodiosa e o visual é refinadíssimo!!!
Mas, mas, mas, o que vocês também precisam ver é o making off de Coraline!!!
É UMA LOUCURA!!!
É uma loucura pois o filme é feito por uma técnica que chama "stop-motion" e, resumindo, é assim: fabricam vários sofisticadíssimos bonecos para os personagens -estrutrura metálica articulada, cobertura de silicone super-flexível, roupinhas sob medidas e por aí vai!- e estes bonecos vão ser manipulados por profissionais que vão tirar fotos de todas as posições necessárias para fazer o filme!!!
Traduzindo, aos milhares de desenhos realizados para os desenhos animados tradicionais, anteriores ao advento do computador, correspondem, nesta técnica, milhares de fotos!!! Os milhares de desenhos, já era loucura, mas deste jeito, fica ainda mais trabalhoso, mais profissionais envolvidos, mais técnicas, mais materiais, enfim, mais loucura!!!
Confesso que eu fiquei impressionadíssima por esta descoberta e ainda estou na dúvida se tendo mais para pensar que é loucura técnica ou se é artesanato moderníssimo, pois tem muitos artistas/artesãos trabalhando no filme!!!
O diretor do filme, um famoso chamado Henry Selick, argumenta que é graças a esta realidade dos bonecos e dos cenários, graças a este requintado artesanato humano, que o filme tem a realidade que tem, antes e além da qualidade plástica.
Não sei se é bem assim, mas o fato é que o filme realmente encanta!
Enfim, o convite está feito:
"CORALINE E O MUNDO SECRETO"
Aluguem, ou comprem logo, vale a pena,
e assistam, com seus filhos, para quem tem filhos!

PS: No Youtube, vocês encontram vários trechos do filme.